Neste atual momento de guerra e barbárie russa contra a Ucrânia, onde está havendo um cancelamento geral em relação a tudo o que é da Rússia, é preciso separar a literatura russa, a música russa e as artes russas (como um todo) desse balaio de boicotes. Eu não vou deixar de ouvir Stravinsky ou de ler Dostoiévski porque um político maluco está perdendo o mínimo de sanidade que tinha e agora está tendo um ataque passadista de histeria bélica soviética -- algo que nem mesmo a maioria do povo russo apoia. Neste post quero vos apresentar, então, o inventivo compositor inglês, de origem nativa russa, Gabriel Prokofiev. Ao ouvir sua música em fins de 2021, me sobreveio um misto de epifania e sentimento de indignação -- daquele tipo: "P$44@, por que não vemos mais disso acontecendo?" --, que acabou por me instigar a refletir sobre o estado da arte, mais especificamente sobre o estado da música erudita atualmente. E a reflexão começa pelo o que nos é mais palpável e visível. Se você, caro ouvinte-leitor, quiser ficar por dentro do que anda a acontecer de novo no universo da música erudita, provavelmente você não terá uma experiência abundante e será logo vencido pela fadiga: você terá que ir ao garimpo de espaços alternativos -- como este blog, e outros links... -- e pesquisar mais sobre os ensembles, as orquestras e os concertistas mais outsiders e independentes -- e até mesmo aqui na web, a segmentação comercial de "nicho" escanteia os compositores contemporâneos, independentes e mais criativos para bem distante do tráfego massivo de informação que chega às pessoas. Não adiantará procurar nas convencionais programações de rádio ou TV, não adiantará entrar nas páginas das grandes gravadoras, e não adiantará seguir as temporadas dos teatros e salas de concerto de "música clássica", pois em todos esses espaços você terá uma excelente programação do que é sempre repetido e constantemente reproduzido, mas jamais terá um mínimo de noção do que acontece no cenário real onde os experimentos e novidades realmente acontecem: você poderá ouvir Vivaldi, Bach, Mozart, Beethoven, Brahms, Chopin e, com muita sorte, encontrará algo de Mahler, Stravinsky, Bartok e Prokofiev, mas dificilmente saberá quais são os compositores mais relevantes da música erudita de hoje em dia...
No Brasil, encontrar programações que tenham o intuito de difundir os mais novos compositores contemporâneos brasileiros deste início do século, é algo muito difícil: tanto que muitos desses jovens compositores acabam preferindo imigrar para outros países onde suas obras possam ser mais apreciadas, ou acabam cedendo no quesito de escrever peças que estejam mais antenadas com esse conservador classicismo constantemente veiculado, do que tentarem expor todas suas ousadias, idiossincrasias e experimentos diante de um sistema que é engessado, excludente e conservador. Nessas grades programáticas geralmente supervisionadas por conselhos executivos constituído de senhores conservadores, ou por algum mecenas-patrocinador do mercado e/ou por algum secretário de cultura apadrinhado, os quais geralmente não são tecnicamente qualificados em artes ou música -- e só estão lá por causa de alguma indicação política --, o sinônimo máximo de "música moderna" e "música contemporânea" é Stravinsky ou Villa-Lobos...ou no máximo Schostakovich, que, apesar da música de sonoridade incomum, foi mais um neorromântico e neoclássico supervisionado pela URSS do que um modernista, de fato. Praticamente toda a música moderna mais desafiadora e, principalmente, a música contemporânea da segunda metade do século 20 e deste início deste século 21 é rechaçada. Estou aqui questionando a qualidade dessas programações? Não! A seleção de nomes, em si, é excelente: Como questionar Bach, Brahms, Schostakovich ou Villa-Lobos?! Mas trata-se de uma programação estática, sem profundidade, inerte, repetitiva, que já não se conecta mais com nosso tempo, muito menos com o público mais ávido por novidade -- e nem estou falando de público jovem ou velho em termos de idade, mas do público ávido por novidade e do grande público que já anda cansado da mesmice, de forma geral. Estou sonhando com uma utopia inalcançável onde a música contemporânea e experimental tenha tanto mercado quanto a dita "música clássica" ou popular? Não! Sabemos que o sistema capitalista no qual vivemos jamais deixará isso acontecer. Estamos apenas almejando um certo equilíbrio que seja constante, com mais programas e espaços dedicados semanalmente ao que realmente há de novo hoje em dia . E nem precisa ser um equilíbrio fifty-fifty: se todas essas programações -- públicas e privadas -- dedicassem 30% do espaço para a música realmente contemporânea e mantivesse essa constância, já teríamos uma revolução no gosto, na escuta, na cultura, nas artes como um todo. Ou seja, essas fundações, associações, rádios, programas de TV, museus, temporadas de orquestras e outros espaços e empresas do ramo artístico-cultural poderiam muito bem elaborar, por exemplo, um script onde a música contemporânea de John Zorn ou de Gabriel Prokofiev pudesse ter ao menos um espaço mínimo e constante ante ao romantismo de Brahms e Chopin, ou as discografias de ensembles fantásticos de música contemporânea como London Sinfonietta, Allarm Will Sound, Ensemble Modern e Bang On A Can pudessem ser mostradas com certa regularidade. Porém, essa música mais desafiadora das últimas décadas simplesmente não faz parte do planejamento. E quando raramente há algum programa dedicado à algum compositor contemporâneo, geralmente trata-se das obras mais palatáveis desse compositor, como se esse tipo de manipulação continuasse a ser eficiente na atual era do streaming, onde os ouvintes mais curiosos têm acesso a tudo e saberão que se trata de manipulação. A situação é tediosa, e não há sinais de que isso possa melhorar.
Aliás é engraçado, sobretudo aqui no Brasil, como alguns pseudo-experts mencionam Stravinsky e Villa-Lobos para se destacarem como sumários conhecedores e apreciadores de "música moderna" e "música contemporânea", quando nessas últimas décadas de nossa época e agora mesmo, quase um século depois das obras desses primeiros modernistas da Segunda Revolução Industrial, existem inúmeros novos compositores, experimentalistas e músicos inventivos que realmente estão fazendo música nova, música realmente contemporânea, conectada com a realidade e os dramas da nossa Era Digital -- essa nossa era que também, logo logo, será suplantada por algo como a uma nova Era Robótica-Cibernética com direito à Metaverso, novas possibilidades criativas e tudo o mais. Porque é isso que aprendemos na história da música: em cada época da história, os compositores exploraram, sim, suas idiossincrasias e suas preferências, mas sempre alinharam suas expectativas com as mudanças e as influências dos tempos em que viveram, e sempre fizeram música conectada com o tempo de suas existências: se inspirando nas inovações deixadas pelo mestres do passado, sim, mas enxertando, em suas criações, novas formas, novas estruturas, novos experimentos e novas tecnologias -- e assim, a arte sempre se renova numa conexão entre passado e presente e se projeta ao futuro para influenciar novos inovadores lá adiante. Stravinsky, por exemplo, fez música nova se inspirando no ballet moderno, nas modernidades sociais da sua época e nas novas sincopações e exuberâncias do jazz. Prokofiev, contemporâneo de Stravinsky, também começou a escrever peças tão impactantes em termos cromáticos, que o governo Russo passou rechaçar sua obra em certos momentos -- isso já no início do século 20. Ou seja, esses compositores e as programações nas quais eles eram inseridos estavam, sim, dando continuidade na história milenar da música erudita, mas eles estavam criando música nova, eles estavam inovando, eles estavam criando um novo mundo musical com novas referências. Então por que hoje temos de ouvir sempre as mesmas referências de séculos e mais séculos atrás, sempre as mesmas programações com sempre os mesmos nomes? Alguém poderá rebater: "Aaahhh, mais a música de qualidade é atemporal...blá lá blá... Sim, toda a música boa é atemporal, e precisamos continuar a ouvir a música de Bach -- aliás até acho interessante quando músicos de jazz como Keith Jarrett, Brad Mehldau e André Mehmari, por exemplo, gravam Bach sob novos contextos --, e é possível que exista mais modernidade em Bach do que em muitos nomes da música contemporânea -- isso é fato --, mas a música de Bach não é a música do nosso tempo: ela é atemporal apenas enquanto referência histórica, enquanto marco histórico. Peguem o exemplo de Vivaldi: ele fazia uma música tão moderna para a época da primeira metade do século 18, tão rica, tão bela e bem elaborada, com todos aqueles efeitos que tentavam reproduzir os sons da natureza e das tempestades, mas no final do século 18 ninguém mais aguentava ouvir suas óperas ou as peças de L'estro armonico ou de Il cimento dell'armonia e dell'inventione (libreto onde consta "As Quatro Estações"), pois agora as pessoas queriam ouvir Mozart, Haydn, Beethoven... Ou seja, Vivaldi continua atemporal enquanto marco histórico e enquanto uma audição terapêutica que nos teletransporta ao passado, mas sua música não era mais a música do final do século 18 e início do século 19, assim como ela não é mais a música do século 21. Agora os tempos são outros e precisamos ouvir mais a música do nosso tempo. Acabamos de entrar na terceira década do século 21: onde a organicidade dos instrumentos acústicos divide espaço com os sintetizadores e instrumentos eletrônicos digitais; onde DJ's como Aphex Twin e Squarepusher são considerados compositores tão geniais e criativos para nosso tempo quanto Stravinsky ou Prokofiev foram para o início do século 20. E é por isso que neste post, quero vos apresentar a obra de Gabriel Prokofiev, neto de Sergei Prokofiev, ao invés de indicar aqui, pela enésima vez, mais alguma "nova" versão das integrais dos Concertos de Brandenburgo, ou da obra camerística de Brahms, lançada por mais algum ensemble de renome pela Deutsche Grammophon.
Gabriel Prokofiev nasceu em 6 de janeiro de 1975. Sua mãe era uma arteterapeuta inglesa e seu pai foi o artista visual russo Oleg Prokofiev, filho do célebre compositor Sergei Prokofiev. Gabriel Prokofiev, que obteve graduações de música e composição na Universidade de Birmingham e na Universidade de York, poderia muito bem seguir a linhagem estética do avô Sergei ou uma postura mais confortavelmente neoclássica, mas ao invés disso tornou-se produtor de música eletrônica, empunhando eletrônicos e sintetizadores e tocando em clubes suas amostragens de estilos contemporâneos de eletrônica como techno-dance, electro-funk, hip-hop, grime, IDM, entre outros. Mas essa faceta inicial de raves e apresentações em clubes apenas lhe daria bagagem e lhe sedimentaria um desejo ainda maior de perseguir o legado do seu avô, sim, mas criando música nova, criando uma música conectada com seu tempo, criando uma mistura de música sinfônica mui elaborada com elementos desses estilos contemporâneos de música eletrônica. Como Gabriel Prokofiev naturalmente não encontraria o apoio necessário no sistema mainstream, em 2003 ele funda, então, a gravadora independente Nonclassical, que além de contar com um selo que impulsiona novos artistas e compositores, também conta com um club que atrai jovens que são interessados nessa contemporaneidade mais criativa. Ademais, as reimaginações que G. Prokofiev aplica sobre as obras do repertório barroco, clássico e romântico (fotos acima) também é uma linha de trabalho interessante e divertida, ficando aqui como uma indicação indireta para o ouvinte-leitor mais interessado. Abaixo exemplifico alguns dos últimos registros da inventiva produção de Gabriel Prokofiev. Clique nos álbuns para ouvi-los.
Este álbum acima documenta dois excelentes concertos escritos por Gabriel Prokofiev: seu Concerto para Saxofone e Orquestra e seu Concerto para Bumbo. O Concerto para Saxofone foi encomendado pelo maestro russo Andrey Breyko, que estreou a obra em 2016 em uma première com a Filarmônica de Nápoles (Itália) e fez uma segunda apresentação junto à Orquestra Sinfônica de Detroit (EUA), tendo como solista ninguém menos que Branford Marsalis, um dos maiores concertistas e saxofonistas de jazz das últimas décadas. Interessante notar que Gabriel Prokofiev não tem a pretensão de mostrar um saxofone jazzístico nesta peça -- apesar da fluência jazzística de Branford contribuir, de forma implícita, com as partes em que os fraseios são mais rápidos e articulados --, mas sim de realmente trazer o saxofone, que é um instrumento de identidade mais jazzística, para o plano da música sinfônica através de um peça melódica, bem articulada e bem conectada com a forma do concerto e seus adereços, seus pontilhismos, seu jogo de perguntas e respostas, os efeitos entre naipes, e todos os seus outros adereços sinfônicos. Já o Bass Drum Concerto, foi encomendado e comissionado pela London Contemporary Orchestra e pela Princeton Symphony, e concluído em 2012, sendo exclusivamente dedicado ao virtuose da percussão sinfônica Joby Burgess. A peça, segundo a crítica, nos oferece uma majestosa performance que tenta trazer o bumbo e a percussão sinfônica para o primeiro plano, para o plano protagonista do concerto, uma vez que este instrumento sempre esteve relacionado como um detalhe ao fundo da orquestra para efeitos bem pontuais e ocasionais. O álbum foi gravado em Yekaterinburg, Rússia, com a Ural Philharmonic sendo conduzida por Alexey Bogorad.
Este álbum registra o Concerto para Violoncelo de Gabriel Prokofiev, peça que foi encomendada pelo célebre violoncelista russo Sasha Ivashkin, e seu já célebre Concerto for Turntables No.1, uma peça que já pode ser considerada uma obra clássica do repertório contemporâneo, uma vez que, desde sua estreia, já foi interpretada mais de 50 vezes na Europa e nas Américas. O Concerto for Turntables No.1 foi concluído em 2006, originalmente encomendado pelo curador inglês Will Dutta. A peça foi estreada em 2009 pelo Dj Yoda junto à Heritage Orchestra e teve sua primeira grande apresentação de gala em 2011 com o Dj Mr Switch como solista num concerto no BBC Proms, em Londres, um concerto que foi considerado um marco na carreira de Gabriel Prokofiev e um marco da música contemporânea. Para a gravação deste álbum, G. Prokofiev convidou o então colaborador Dj Mr Switch -- um virtuose dos toca-discos, cinco vezes campeão mundial da competição de deejaying -- e contou com a Orquestra Filarmônica de Ural (Rússia) sob a direção de Alexey Bogorad. Ao convidar DJ's como Yoda e Mr Switch para atuar como concertistas ao lado de grandes orquestras, Gabriel Prokofiev evoca com essa peça para toca-discos (turntables) o mesmo perfeccionismo que os compositores de outrora evocavam em suas peças e concertos escritos exclusivamente para grandes virtuoses do violino ou do piano. Mr Switch, também conhecido como Anthony Culverwell, é um dos DJs mais talentosos do Reino Unido: em 2008, com apenas 19 anos, ele ganhou seu primeiro campeonato mundial de DJ's -- o DMC Battle For World Supremacy --, e seguiu defendendo o título desde então, sendo campeão mundial por 3 anos consecutivos (2008, 2009 e 2010). Mas também existe a gravação abaixo com DJ Yoda -- também considerado um dos DJ's mais excepcionais dos últimos tempos -- junto à interdisciplinar Heritage Orchestra, gravação que particularmente considero mais interessante.
Diante dessas obras idiossincráticas e diante de todo o legado deixado por Sergei Prokofiev, muitos podem questionar qual o peso da influência do legendário compositor russo na música do neto naturalizado inglês. Em recente entrevista na Final Note Magazine, G. Prokofiev deu algumas elucidações de como enxerga a música e arte como um todo, e qual sua relação com a música do avô. Como o próprio ouvinte perceberá nestes álbuns aqui indicados, não é intenção do Prokofiev-neto trazer elementos explícitos da música do Prokofiev-avô -- apesar de que é natural que algumas inspirações implícitas apareçam aqui e ali em alguma peça. Gabriel também deixa claro que nunca teve a intenção de soar como um compositor anárquico de ruptura -- ou seja, sua intenção não é soar, por exemplo, como um compositor avant-garde no sentido de romper com os padrões do mainstream. Muito pelo contrário. G. Prokofiev relata que, apesar de sempre ter a figura viva do seu avô em sua memória -- e ele lembra que o avô chegou leva-lo à premières, e após os concertos ele podia ir ao camarim observar os músicos e conhecer o maestro --, ele logo se enveredou para trabalhar com artistas da música pop e encaminhou-se para uma carreira totalmente mergulhada na eletrônica, o que fez com que ele só enxergasse o peso e a influência do avô mais recentemente, quando ele passou a se aprofundar na arte de compor para orquestras e ensembles variados. Além do mais, Prokofiev diz que realmente se enxerga na missão de conectar-se às pessoas e ao nosso tempo: ele quer soar simultâneamente complexo e palatável; ele quer soar erudito e pop ao mesmo tempo; ele quer juntar o público do erudito e da eletrônica numa mesma sala de concerto; ele quer trazer o público "careta" para ouvir música eletrônica no seu club Nonclassical, e quer levar os "mandrakes" da eletrônica para os ambientes vitorianos. Ainda nessa linha, Prokofiev também relata como que até recentemente ele tinha uma visão muito clássica e limitante de uma orquestra sinfônica: talvez ainda com os ecos da memória da sua infância, de quando seu avô Sergei o levava para assistir aqueles seus imponentes concertos soviéticos, sua impressão se fixou na ideia de que quando uma orquestra toca, todas as atenções devem estar somente no maestro e na interação entre naipes, pois há tantos detalhes para se observar nos arranjos e orquestrações, tantas melodias e harmonias para se abstrair e assimilar, que instalar qualquer outra linguagem artística num concerto de peça sinfônica -- como uma instalação audio-visual, por exemplo -- lhe parecia uma intromissão inconcebível, que poderia tirar totalmente a atenção do que é mais sublime num concerto ou sinfonia. Mas, mais uma vez, G. Prokofiev percebeu que essa é mais uma das ideias limitantes e causadoras do afastamento da música erudita do seu público jovem e do seu enclausuramento em um antiquário, uma bolha ou um museu de antiguidades com ingressos exclusivos para um público de idosos endinheirados. Para mostrar como que sua obra tenta quebrar essas barreiras, ele cita, então o exemplo do seu Concerto for Turntables, que, numa première em Glasgow com a Royal Scottish National Orchestra, foi apresentado com um VJ muito talentoso que combinou toda uma gama de diferentes técnicas de edição de imagens e clipes em tempo real, usando uma projeção ultramoderna de vídeo para que o público pudesse ver exatamente como o turntablist estava manipulando os toca-discos e sintetizando os sons junto à orquestra, performance que atraiu e envolveu o público com uma adesão e um sucesso como poucas vezes ele presenciou em uma sala de concerto. O jovem Prokofiev, enfim, talvez demore um tanto para alcançar tantas pessoas como seu falecido avô hoje alcança, mas esse seu caminho de quebrar barreiras e integrar linguagens se mostra não menos que promissor!
Este álbum acima e este single abaixo, lançados recentemente em fins de 2021, são os dois mais recentes registros a documentar as fusões de eletrônica com música sinfônica que Gabriel Prokofiev vem empreendendo. Nesses tipos de obras, G. Prokofiev encarna um viés mais direcionado à reflexão e autorreflexão relacionado à vida urbana e aos recentes dramas que tem levado esse mundo cada vez mais para uma era de distopia. Este álbum acima foi gestado logo no início de 2020, quando a pandemia da COVID-19 começava a atacar, e logicamente esses seus sentimentos e percepções sobre esse momento crítico da história da humanidade acabaram por ser inflexionados na peça. Na ocasião G. Prokofiev se encontra com o maestro russo Stanislav Malyshev e sua interdisciplinar OpensoundOrchestra, e juntos elaboram e gravam este registro, que traz um som híbrido e inclassificável de arranjos de cordas com beats e sons eletrônicos -- analógicos e digitais -- um tanto próximos aos estilos house, techno, grime, IDM e ambient music. Para tanto, além dessa híbrida tessitura sonora, G. Prokofiev também variabiliza com muita criatividade as métricas das peças, na intenção de apresentar beats mais quebradiços, com ponteios mais angulares e sincopações mais sinuosas: vide as faixas "Fivatak" e "Mobocracy" em 5/4, "Seven Steps" e "Ball Game" em 7/4, e "Memory Field" em 3/4. No meio desses arranjos híbridos de cordas e eletrônica, eis que surge um curioso interlúdio intitulado "1, 2, 3, 4, 5, 6" que traz uma exótica amostragem vocal de 50 segundos, uma miniatura que G. Prokofiev confessa ter tirado de uma parceria que ele empreendeu com a Alexander Whitley Dance Company (do Reino Unido) e o experimental grupo de malabaristas-circenses Gandini Juggling. Já o single abaixo é um híbrido de flashes, sintetizadores, efeitos, recortes de material previamente gravado e colagens inúmeras -- "Six Hesit Heist is a collision of orchestra and electronic clicks, synths, kicks & field recording", é como explica Prokofiev. O álbum evoca paisagens urbanas – gravadas em Seul, Coréia, e em outros lugares -- e suas colagens nos faz proporciona um imagético cenário de tour e aventura sonora. G. Prokofiev conta que, como o lockdown não lhe permitia juntar-se à uma orquestra ou mesmo à um pequeno ensemble para gravar música nova, ele acabou tendo a ideia de ele mesmo entrar num estúdio e editar materiais pré-gravados, gravações de campo, sintetizar um esboço de um balé não utilizado em trabalhos anteriores, entre outras ideias soltas que foram juntadas para dar vida a este híbrido single.
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