— Deutsche Grammophon (DG) (@DGclassics) July 21, 2023
O celebrado selo de música erudita Deutsche Grammophon anunciou, há poucos dias, uma reedição em box de luxo da sua lendária série de vinis Avantgarde, com peças gravadas entre 1968 e 1971. É a primeira vez que essa série, completando agora 55 anos, é reeditada para ser lançada em sua totalidade, sendo compactada num luxuoso box set de 21 CD's. Segundo a Deutsche Grammophon, "a série Avantgarde serve como um documento histórico para uma época de mudança radical no pensamento musical e na quebra de fronteiras artísticas". A pergunta "O que é música?" confrontou muitos dos compositores e músicos envolvidos na série, uma vez que o espírito antiautoritário das juventudes e contraculturas insurgentes das décadas de 1960 e 1970 foi uma influência dominante na quebra de paradigmas e fronteiras protagonizada por esses compositores. A Série Avantgarde da Deutsche Grammophon reflete, então, toda uma miríade de confluências e correntes estéticas vigentes na época, sendo um retrato importante para que os interessados em música de vanguarda estejam inteirados sobre as mais criativas e transformadoras obras que surgiram nessa época no âmbito das orquestras, dos ensembles e conjuntos de câmara, das peças para instrumentos solo, da música eletroacústica e até dos compositores e músicos que começaram contemplar a crescente tendência das improvisações livres. Era uma época em que o rock, o jazz, as subsequentes transformações de vanguarda no âmbito da música e das artes como um todo refletiram as lutas e protestos contra as guerras (a Guerra Fria e a Guerra do Vietnã) e a favor dos Direitos Civis, assim levando a juventude a se rebelar completamente contra os velhos valores do conservadorismo social e do status quo, um fenômeno que fez renascer uma nova sociedade marcada por hibridismos e novas radicalizações. E a música erudita, que desde os anos de 1920 já vinha se radicalizando em suas fronteiras estilísticas, chegava agora num ápice criativo sem precedentes, marcando uma virada daquela inicial modernidade dodecafônica-serial de outrora para uma ebulitiva transmodernidade ou pós-modernidade agora inclassificável. O box set, enfim, vem talhado com um sofisticado design colorido de autoria do renomado designer gráfico Holger Matthies e vem com um livreto de 186 páginas com resenhas e comentários (disponíveis em inglês e alemão) escritos por compositores e especialistas, além de fotos históricas resgatadas diretamente do arquivo da Deutsche Grammophon. A lista de compositores e músicos abordados, disposta na plataforma da 👉Discogs, inclui Witold Lutoslawski, Krzysztof Penderecki, Toshiro Mayuzumi, Karlheinz Stockhausen, Gerd Zacher, Mauricio Kagel, Juan Allende-Blin, György Ligeti, Vinko Globokar, Luciano Berio, Carlos Roqué Alsina, Bernd Alois Zimmermann, Saschko Gawriloff, Siegfried Palm, Aloys Kontarsky, John Cage, Dieter Schnebel, Rainer Riehn, Gottfried Michael Koenig, Zoltán Pongrácz, Earle Brown, Wolf Rosenberg, Luc Ferrari, Lukas Foss, Lejaren Hiller, Elliott Schwartz, Roland Kayn, Luigi Nono, Franco Evangelisti, Nicolaus A. Huber, Leo Küpper, entre vários outros. O blog FreeForm, FreeJazz também recomenda a aquisição e até nos disponibilizou uma 👉playlist com peças de alguns compositores da série! Para aficionados e completistas, vale à pena pôr as mãos nos bolsos para dispor de algo em torno a 100 euros pela aquisição do box set!
— andré capilé (@andre_capile) July 12, 2023
Acaba de sair do forno uma edição em português do livro "Black Music", que o celebrado poeta, pensador e crítico americano Amiri Baraka lançou em 2009. O livro foi gestado a partir de um conjunto de ensaios, críticas, reflexões, entrevistas, encartes de LP's, análises musicais e impressões pessoais que Amiri Baraka publicou entre os anos de 1959 e 1967 sobre os mais modernistas músicos de jazz da época tais como John Coltrane, Thelonious Monk, Miles Davis, Ornette Coleman, Cecil Taylor, Archie Shepp, Sun Ra e vários outros. O livro também inclui uma entrevista de 2009 que Baraka cedeu à Calvin Reid na Publishers Weekly. Trata-se, afinal, de um registro literário importante no quesito de documentar uma fase de mudança de paradigma na linha do tempo da modernidade do jazz, principalmente considerando-se que Baraka não apenas dispunha —— e dispõe —— de poética e musicalidade aflorada para sentir e transcrever em palavras as oralidades, os novos tons e os novos signos vanguardistas que já nasciam na época, mas também dispunha como poucos —— e dispõe —— de uma ótica realista e uma aflorada poética social para nos elucidar com mais clareza como que música e sociedade se conectavam no âmbito do povo afro-americano, portanto sendo um documento importante para entender os movimentos (musicais, culturais, sociais e etc) que transformaram o jazz e a cultura americana como um todo nos anos 60. No decorrer do livro, Baraka inclui uma seleção chamada "Uma breve discografia da Nova Música", por meio da qual nos introduz aos primeiros rompantes do free jazz, ou "new thing", como a free music também chegou a ser chamada na época. Essa fresca edição em português ficou à cargo do tradutor André Capilé e está sendo lançada pela editora sobinfluência sob o título "Black Music – Free jazz e Consciência Negra 1959 – 1967", oferecendo agora uma das poucas oportunidades para que os brasileiros fãs de jazz tenham em mãos esse rico documento literário sobre o jazz dos anos 60 sem se preocupar com a leitura fluente em inglês. De todos os grandes livros e ensaios publicados por Baraka, há apenas um título seu lançado no Brasil, que é o livro "Blues People – Black Music in White America" (1963), publicado pela editora Record sob o título "O Jazz e Sua Influência na Cultura Americana": e, na verdade, este livro "Black Music" surge logo na sequência como um continuum natural de "Blues People". Aos interessados em adquirir o livro, sugiro que acesse 👉o link da sobinfluencia, onde tem lá um prefácio como aperitivo, e também leia a interessante matéria publicada pela 👉Revista NOIZE sobre Amiri Baraka.
— DownBeat Magazine (@DownBeatMag) July 25, 2023
Também acaba de sair do forno a tão esperada lista de "melhores do ano" pela aclamadíssima Revista Downbeat. Trata-se da Downbeat Critics Poll, que a revista costuma publicar sempre na sua edição de agosto, listando os mais votados álbuns e os mais votados músicos segundo seus mais de 100 críticos do mundo todo convidados a participar da enquete: os rankings incluem os mais votados em cada instrumento e em categorias específicas como "Hall of Fame", "Album of the Year", "Historic Album", "Artist of the Year" e "Rising Star". Nesta edição de 2023 a revista, que caminha para ter seu 90º ano de aniversário, publica sua 71ª enquete, ratificando sua importância histórica e documental em pleno século 21. A enquete costuma ser, de fato, um retrato importante para que os fãs de jazz estejam inteirados sobre alguns dos principais artistas em maior evidência na atualidade do jazz. Mas, também, costuma ser um retrato um tanto quanto repetitivo, deixando de fora músicos altamente criativos e suscitando dúvidas legítimas quanto aos critérios de voto, principalmente por haver costumeira repetição de músicos —— geralmente medalhões do jazz, músicos já por décadas muitíssimos aclamados —— os quais ano após ano figuram entre os mais votados, mesmo quando tais músicos não lançam nenhum álbum ou projeto significativo no ano anterior e/ou no ano-calendário. Queremos acreditar que, afora os álbuns e projetos específicos, os críticos da revista também levam em conta outros fatores de evidência como, por exemplo, a agenda de shows e concertos de tais artistas, suas aparições em artigos, entre outros fatores. Ou, talvez, haja mesmo certa arbitrariedade ou viés comercial para escolher quais nomes devem estar em evidência. Ou, talvez, haja apenas certo saudosismo numa escolha de nomes que ratifique essa premissa inerente ao jazz de sempre consagrar seus maiores mestres vivos, estabelecendo níveis elevados para a consagração de músicos que surgiram em gerações mais jovens: algo que é valido, desde que esses mestres recebam votos não apenas pelo peso histórico que seus nomes detêm, mas que recebam votos principalmente pela evidência dos seus álbuns e projetos no ano anterior e/ou no ano-calendário à enquete —— afinal de contas, os leitores esperam que a enquete produza um retrato da contemporaneidade. De qualquer forma, o critério principal deveria ser sempre o quão ativos e criativos tais músicos foram nesse período à ponto de justificar que seus nomes e seus álbuns sejam eleitos. Contudo, e como já citado, a Downbeat Critics Poll é um retrato que frequentemente proclama nomes que de fato estiveram relacionados a projetos e álbuns criativos. É o caso da hiper criativa guitarrista Mary Halvorson, mais uma vez eleita a guitarrista do ano, também tendo seu excelente álbum Amaryllis & Belladonna (Nonesuch, 2022) eleito na categoria "Album of the Year". O trompetista Ambrose Akinmusire também é merecedor de encabeçar a lista na categoria do seu instrumento: a julgar por seu ótimo álbum independente de trompete solo Beauty is Enough (Origami Harvest, 2022), sem mencionar, por exemplo, sua evidência como recente nomeado diretor artístico do Herbie Hancock Institute of Jazz. Outro nome de destaque que também tem lançado álbuns e projetos admiráveis nos dois últimos anos é o altoísta Immanuel Wilkins: esse jovem sax-altoísta rapidamente saiu da categoria "Rising Star" para agora figurar como nome emblemático do sax alto na atualidade. O mesmo pode-se dizer da harpista Brandee Younger e do vibrafonista Joel Ross, os quais não demoraram para sair do status de "revelação" para serem evidências principais. Já em relação às categorias "piano" (onde o jazz master Kenny Barron foi eleito) e "keyboard" (onde o eleito foi o jazz master Herbie Hancock), eu particularmente considero que a pianista Satoko Fujii e o tecladista John Escreet (que nem aparece entre os relacionados) têm lançado trabalhos interessantes os quais já os creditam a ganhar ao menos as primeiras posições entre os mais votados. Outro destaque inconteste é o álbum Mélusine (Nonesuch, 2023) da cantora Cécile McLorin Salvant, que registra um dos mais diferenciados e multifacetados trabalhos de vocal jazz dos últimos tempos. A categoria de "Rising Star" em cada instrumento também é interessante para que conheçamos os principais jovens recentemente revelados como "promessas" ou "importantes para o futuro" do jazz: e neste certame de 2023, a votação da DB Magazine evidenciou nomes proeminentes como Kate Gentile (percussão), Brandon Seabrook (banjo), Isaiah Collier (sax tenor), Lakecia Benjamin (flauta), Etienne Charles (trompete), Alexa Tarantino (sax soprano), Immanuel Wilkins (composição) e Samara Joy (cantora-revelação do jazz que venceu a cantora brasileira de pop-funk Anitta no Grammy, enfurecendo os fãs brasileiros). No demais, deixo aqui, para que nossos leitores tire suas próprias conclusões, o link que a 👉DB Magazine disponibilizou com parte da sua edição de agosto digitalizada contendo a lista completa dos álbuns, instrumentistas, compositores, arranjadores e etc... que foram votados, bem como a quantidade de votos que cada um recebeu. Esta DB Critics Poll também coroou no seu Hall of Fame a jazz master da harpa Alice Coltrane: entre atos e hiatos, a harpista está há décadas em regular evidencia, tendo contribuído enormemente para a evolução do spiritual jazz. Em seguida, nas próximas edições, teremos a Downbeat Readers Poll, votada pelos leitores da revista.