— Sesc São Paulo (@sescsp) September 30, 2023
De 18 de outubro a 5 de novembro acontece em São Paulo o já emblemático festival SESC Jazz, nas unidades do SESC, nossos queridos centros de lazer, arte e cultura mantidos via legislação federal por empresas dos setores de serviços e comércio. Para esta edição, diferenciando-se das edições passadas, o gênero do jazz foi diminuído para que o line-up abraçasse alguns artistas adjacentes da world music, da MPB e um mínimo de música instrumental brasileira. Dessa forma, a quantidade de bandas exclusivamente instrumentais foi um tanto diminuída para dar lugar a cantores de vários países. É até muito interessante que nessa edição de 2023 as expressões diaspóricas do continente africano, por exemplo, estejam bem representadas. E, logicamente, espera-se que o jazz tenha sido considerado como o principal ingrediente diaspórico nas escolhas. Mas essa diminuição de músicos e bandas de jazz propriamente, bem como de instrumentistas e bandas das adjacentes expressões instrumentais da nossa contemporaneidade, já nos deixa negativamente apreensivos quanto aos critérios de curadoria a serem adotados para os próximos anos. Será, agora, uma curadoria mais "crossover"? Ainda assim, amantes de jazz e de música instrumental poderão assistir gênios e bandas legendárias tais como os pianistas César Camargo Mariano e Amilton Godoy, o coletivo Black Monument Ensemble (EUA), o pianista (multi-instrumentista) Egberto Gismonti, a clarinetista Angel Bat Dawid (EUA), a big band brasileira Spok Frevo Orquestra, o pianista André Mehmari na companhia da cantora portuguesa Maria João, a Orchestre Poly-Rythmo De Cotonou (Benin), o pianista Alfredo Rodriguez (Cuba) e o baterista americano Makaya McCraven. Uma outra observação é que a presença da mulher até foi valorizada, mas quase todas as mulheres são cantoras. Quem sabe na próxima edição de 2024, a curadoria nos traga mais instrumentistas mulheres, refletindo o fenômeno atual onde muitas delas não apenas estão surgindo nas cenas do jazz e da música improvisada em todo o mundo, mas também estão se destacando como figuras altamente criativas, inovadoras, verdadeiras expoentes da contemporaneidade —— a exemplo das improvisadoras da cena escandinava, por exemplo. Os shows e concertos, dos artistas nacionais e internacionais, serão realizados nos palcos do novo Sesc 14 Bis e do Sesc Pompeia. Para quem gosta de boa música, cantada ou instrumental, já fique esperto para comprar os ingressos: as vendas começam no dia 11/10, às 17h, através do aplicativo Credencial Sesc SP.
— Jacob Rosenberg (@jrrosenb) September 28, 2023
Em setembro/ 2023 noticiamos aqui o movimentado aniversário de 70 anos de John Zorn, que foi repleto de concertos, shows, homenagens, felicitações e artigos. E não é para menos: contar com a presença de uma das grandes lendas vidas da música contemporânea é no mínimo um privilégio, e os ouvintes mais antenados sabem exatamente do que estou falando, sabem o quão rico é o mosaico estético-artístico desse grande compositor, improvisador, curador, empreendedor e líder do cenário Downtown. Pois eis que no final desse mesmo mês, não bastando toda a repercussão do aniversário do gajo, é a gravadora Tzadik quem nos presenteia com um ato inesperado. O selo, fundado por Zorn em 1995 para dar vazão em suas gravações e em gravações mais radicais de outros músicos, subiu boa parte do seu catálogo de álbuns —— mais de 230 títulos, só na primeira talagada... —— para as plataformas de streaming! Nessa altura do campeonato, onde há pelo menos uma década que o streaming já foi incorporado nas nossas vidas como a via dominante de disseminação e comercialização da música, algum dos ouvintes-leitores, desavisado, até poderá questionar: Ué!, porque isso tem de ser, necessariamente, uma notícia? O catálogo da Tzadik ainda não estava disponível no Spotify e noutras plataformas de streaming? Não, não estava. Isso porque Zorn sempre foi praticamente uma espécie de eremita em relação a esse capitalismo usurpador, um empreendedor que fez crescer seu negócio pelas vias físicas sempre com muito trabalho, muito senso de comunidade —— liderando com muito empenho uma comunidade de artistas hiper criativos no cenário Downtown —— e sempre com muito foco: só para se ter uma ideia, Zorn chegou a admitir em entrevistas que nunca possuiu TV, não possui redes sociais, é totalmente contra as políticas usurpadoras das gravadoras do alto corporativismo e das plataformas digitais e é totalmente indiferente a qualquer das distrações midiáticas que tão comumente nos adoece, tendo foco total mesmo no seu hobby de colecionador de discos, na gestão do seu nightclube Stone e nos seus concertos, shows e gravações pela Tzadik, além das produções que ele fomenta para estar sempre registrando o maior número de músicos criativos e experimentais pelo selo. Dessa forma, foi super comum presenciar, nessas últimas décadas, John Zorn e a Tzadik lançarem dezenas de gravações num mesmo ano, ano após ano: em 2021, por exemplo, Zorn lançou pelo selo mais de uma dezena de títulos sob seu nome, e mais outros tantos registros sob os nomes de músicos afiliados. É muita música boa, sob as mais variadas estéticas, estilos de avant-garde e diretrizes experimentais, que agora o ouvinte-leitor poderá ter acesso nas principais plataformas de streaming (Spotify, Qobuz, YouTube Music, Amazon Music e outras)! O fato é que a grande quantidade de boa música lançada ano a ano pela Tzadik nessas últimas décadas —— música criativa, diversa, experimental e ricamente incomum ante aos padrões mercadológicos das grandes majors —— praticamente transformou a gravadora e o selo numa fonte de encontro de grandes músicos e numa potência eruptiva de bons lançamentos que hoje agrada uma legião de fãs pelo mundo todo, elevando o empreendimento da sua condição de um pequeno selo de influência local ali na Downtown para uma etiqueta de procura e demanda já a nível mundial. Então, é bem possível que John Zorn tenha sido compelido a aumentar a distribuição do catálogo da Tzadik via streaming, mesmo sendo adepto à distribuição do formato físico e sendo totalmente contra a distribuição digital onde o Spotify, por exemplo, paga míseros US$ 3,97 para cada mil players, gerando às pequenas gravadora e aos artistas independentes valores muito aquém do que se espera para cobrir os custos de produção e gerar autosuficiência financeira. De qualquer forma, esse seria mesmo o próximo passo a seguir. Essa jogada, mesmo que em atraso, poderá de fato popularizar ainda mais os álbuns da Tzadik —— ao menos entre os ouvidos mais progressistas e experimentados ——, podendo até mesmo alavancar as vendas dos formatos físicos. Até porque o diletante adepto ao formato físico, bem como o inveterado colecionador, sempre manterá seu costume de encomendar e comprar o CD, o compacto ou o LP. Entrem no Spotify, Amazon e outros streamnings e aproveitem o catálogo! Sucesso e vida longa a Zorn e à Tzadik Records!
— MacArthur Foundation (@macfound) October 4, 2023
A MacArthur Foundation acaba de anunciar sua lista de artistas, escritores, cientistas e outros cidadãos notáveis a receber a Bolsa MacArthur, uma bolsa de incentivo às artes e ao conhecimento de mais de US$ 600.000 pagos em parcelas trimestrais ao longo de cinco anos. A MacArthur Fellows é um modelo de incentivo interessante porque ninguém sabe se está sendo considerado candidato: os nomeados são listados de forma totalmente confidencial e anônima, sendo que os candidatos definitivos são avaliados por um comitê cujos membros também atuam de forma totalmente confidencial e anônima. Diversos grandes instrumentistas e compositores de jazz e de música erudita já receberam a bolsa, de forma que nos últimos tempos os comitês, sempre rotativos, tem prezado por diversificar cada vez mais as escolhas, nomeando artistas dos mais variados gêneros —— a exemplo de como os comitês do Pulitzer tem feito, com muito critério e sucesso. Ano passado, em 2022, uma das agraciadas a receber a bolsa na área da música foi a violoncelista Tomeka Reid, expoente da nova geração da AACM, de Chicago. Neste ano, a lista conta com duas personalidades da música: a compositora e pianista de jazz de New Orleans Courtney Bryan e o compositor e performer Raven Chacon, natural de Albuquerque, Novo México. Sobre Raven Chacon, nós o abordamos aqui na ocasião em que ele ganhou o Pulitzer Prize 2022, sendo o primeiro índio nativo americano a ganhar o maior prêmio de música da América. Pois eis que o compositor e performer natural dos povos indígenas da Nação Navajo do Novo México continua a se destacar. Há anos que ele vem sendo premiado e amplamente aclamado por criar pontes entre os sons, temáticas e adereços da sua ancestralidade nativa com as texturas eletrônicas, as improvisações livres, as instalações audiovisuais, as performances experimentais de campo e outras formas contemporâneas de arte e criação musical, compondo obras de grande teor temático, crítico e conceitual. No site da MacArthur Fellows, o comitê justifica a honraria dada a Raven Chacon com a seguinte explicativa: "Creating musical works that cut across boundaries of visual art and performance to illuminate landscapes, their inhabitants, and histories". Importante notar que a produção artística de Chacon se dá mais, mesmo, no âmbito de gravações de campo, captações em performances ao vivo em museus de arte, galerias e oficinas, bem como em instalações de audiovisual, gestando poucas gravações definitivamente editadas em álbum. Ainda assim, o compositor e performer tem se destacado como um dos interessantes criadores musicais do nosso tempo, tendo conseguido ampliar a divulgação das suas mostras e captações para muitos adeptos de arte e música contemporâneas.